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Contratos urgentes para São Paulo e pros catadores

Coleta seletiva e limpeza urbana representam 2 bilhões por ano em São Paulo, mal aproveitados há pelo menos 20 anos, sem fazer coleta seletiva, sem educação ambiental e marginalizando as catadoras e catadores de materiais recicláveis

Em outubro de 2024 acabam os contratos da coleta seletiva e da limpeza urbana no município de São Paulo. Foram mais de 20 anos de serviço mal prestado que promoveram o racismo ambiental e negligenciaram o maior contexto de resíduos urbanos do continente. Imagine os números, além do dinheiro público não investido nas catadoras e catadores, o montante destinado para os aterros sanitários, bilhões de reais enterrados e outros bilhões no bolso de meia-dúzia de empresários. 

Como indica reportagem na Folha de São Paulo do dia 3 de abril de 2024, uma auditoria do Tribunal de Contas do Município apontou um sobrepreço de R$2,9 bilhões no contrato de R$10 bilhões para cinco anos de coleta de resíduos elaborado para São Paulo pela gestão do prefeito Ricardo Nunes. Além disso, a indústria da reciclagem de base, feita nos galpões, bairros, coletivos, felhos-velhos, cooperativas e associações, segue sendo marginalizada, sem nenhum apoio, sem tributação adequada e refém de um mercado informal e de um Estado que criminaliza seus trabalhadores.

Os contratos para varrição de ruas e sarjetas, coleta e destinação de resíduos de locais públicos venceram em outubro de 2023 e se referem a seis empresas (Corpus, Sustentare, Locat, Limpa SP, Ecoss Ambiental e Ecosampa). Ecourbis e Loga têm contratos vigentes até outubro deste ano para coleta e destinação de resíduos domiciliares. Neste preço de 2 10 bilhões para 5 anos, um contrato de 20 anos seriam, pelo menos, 40 bilhões de reais nas mãos de 6 empresas, ao invés das mãos de dezenas de milhares de catadoras e catadores - que coletam quase 2 vezes mais que a prefeitura.

Falta de transparência e participação 

A atual gestão da Prefeitura de São Paulo ainda tenta criar argumentos para continuar vendendo um dos maiores contratos do continente mais barato que o quilo do papelão. Essa postura vai contra as políticas ambientais das esferas municipais, estaduais e federais, e é feita sem considerar as principais pessoas quando o assunto são resíduos: as catadoras e os catadores.

Como revela artigo de Mara Gama no Poder 360 do dia 1 de abril de 2024, a gestão do Ricardo Nunes encaminhou uma avaliação da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), organização sem fins lucrativos ligada à Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, comparando vantagens e desvantagens de uma nova licitação ou da prorrogação de contratos. O estudo avaliou que a prorrogação do contrato atual elimina “riscos relacionados com uma nova licitação”. 

Outro ponto muito delicado na gestão de resíduos de São Paulo para a saúde da população é a previsão da instalação de dois incineradores na capital, que emitem gases cancerígenos do efeito estufa, cinzas tóxicas e precisam ser alimentados 24 horas por dia. Seguindo esse caminho destrutivo, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) acabou de aprovar a instalação de um incinerador em Santos mesmo com nota técnica contrária.

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo emitiu uma nota técnica em que denuncia a incineração e aponta, ainda, para “a necessidade de aprimoramento dos programas de coleta seletiva no Estado para que haja ampliação e melhoria na prestação desse serviço, através de investimentos e efetiva priorização de políticas de reutilização, reciclagem e compostagem, diante da importância social, econômica e ambiental dessas atividades.

Segundo Elisabeth Grimberg, coordenadora de Resíduos Sólidos do Pólis, adotar o que projeta o estudo da Fibe é “um retrocesso para a cidade”. As diretrizes “passam por cima de uma articulação que foi construída publicamente e que resultou no plano de gestão integrada”, diz.  “Em 2004, estávamos recuperando 2% dos recicláveis e agora são míseros 3%”, afirma Elisabeth.

Em outubro de 2022, um ano antes do vencimento dos contratos, o Instituto Pólis realizou uma série de debates colocando a concessão de resíduos sólidos da capital paulista em questão, inclusive com participação do poder público, representantes da sociedade civil e catadores, mas apesar das contribuições, a escolha da atual gestão é fazer com que São Paulo tenha um dos sistemas mais insustentáveis possíveis para gestão de resíduos.

O plano e a eleição

Segundo levantamento da Aliança Resíduo Zero Brasil com base no PGIRS (Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos da Cidade de São Paulo), decreto 54.991 de 2 de abril de 2014, a cidade de São Paulo poderia estar recuperando 65% dos orgânicos do lixo doméstico e 85% dos recicláveis. Com essa recuperação, teria diminuição de 30% de resíduos aterrados, viagens de caminhões, gasto de combustível e emissões de GEE (gases do efeito estufa). Além desses ganhos, poderia ter em operação empreendimentos verdes como cooperativas e centrais de reciclagem e compostagem, com ao menos 30.000 postos de trabalho. 

Em abril completam-se 10 anos da elaboração do PGIRS, resultado de ampla mobilização e participação da sociedade civil organizada. Infelizmente, este é um documento que nunca foi utilizado pelas gestões municipais que o seguiram para desenvolver um sistema integrado e efetivo, que combata a pobreza e promova a educação ambiental enquanto faz a transição da maior capital do continente para uma economia circular. A sociedade deve pressionar para que esse plano seja executado por quem é responsável: a prefeitura. Fiscalizar esses contratos para que sejam contratados catadores e catadoras é exercer o controle social para distribuir o dinheiro público para quem mais precisa e que já faz o trabalho sem remuneração.

A linearidade, o consumismo, a promoção da desigualdade e a destruição ambiental, ainda são as lógicas que a prefeitura e o governo do Estado de São Paulo querem que as cidades sigam - tudo isso pelo interesse de quem financia suas campanhas. Mas, o que o povo quer? As necessidades são imediatas: teto, trabalho e pão. São 60 mil pessoas em situação de rua, milhões na pobreza e bilhões de reais enterrados, deixando de gerar renda e garantir direitos para milhares de famílias.

São Paulo pode estar ativando seus 96 distritos com ecopontos, cooperativas e outras formas de organização social de catadoras e catadores de materiais recicláveis, formando agentes multiplicadores de educação ambiental nos territórios, com políticas públicas e projetos sociais interdisciplinares, promovendo uma economia circular integrada com saúde, educação, empregabilidade e desenvolvimento sustentável. Mas parece que a atual gestão prefere investir em 6 empresas e a precarização da qualidade de vida de seus cidadãos. Este ano o eleitorado pode escolher uma nova gestão, que se comprometa a aplicar o PGIRS e melhorar a qualidade de vida da sua população através de um modelo econômico circular e solidário.

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